DOS ESTRUPÍCIOS E TRAMBOLHOS
NA VIDA DAS PESSOAS
João Joaquim
Como profissional da saúde, da vida e da doença, aprendi e
exercito sempre os meus sentidos. Há um princípio por exemplo em medicina de
definir o bom e observador profissional como aquele que começa a examinar
o paciente quando ele chega à recepção e porta do consultório. São detalhes a
ser analisados por exemplo: a marcha, a
postura, mímica, trejeitos etc. Numa consulta médica de padrão-ouro dois itens
são determinantes. O primeiro se chama fácies, que nada mais é do que a
expressão facial do doente. Tal termo se
aplica de fato a uma pessoa que sofre. Ela pode ser característica de cada
doença. Um outro item fundamental se chama ectoscopia, que é uma visão geral de
todos as partes anatômicas, de fato visíveis, sem o exame físico manual do
paciente e sem nenhum outro instrumento. A partir dessa análise da fácies e da
ectoscopia inicia-se o exame físico. Como exemplos dessa ectoscopia, a cor
da pele, a oxigenação das mucosas e pele, contrações faciais, tremores de algum
membro, manchas, lesões cutâneas indicativas de uma doença sistêmica.
Feitos esses adendos iniciais, e os fiz com o
propósito ilustrativo, devo confessar que como iniciado e ensaísta na arte de
cronicar (cronista), gosto muito de observar o mundo, a dinâmica das coisas, o
movimento da natureza e o ritmo da sociedade e das pessoas. Devo à Medicina
este treinamento diário.
Eu tenho observado, com um certo pesar e ceticismo a
desconexão das pessoas com a natureza ao seu redor. Tal fenômeno se deve
justamente a conexão com os produtos, objetos e recursos da internet e da
indústria digital. Cada vez mais nos tornamos uma sociedade e pessoas da
“irrealidade virtual e da ilusão digital”.
Todavia, frente a tantos inventos, modismos e tendências que
dominam os planos, gostos e desejos das pessoas, há em muitos segmentos
profissionais uma preocupação e dedicação com a chamada qualidade de vida. Tal
busca de satisfação tem sido lembrada e estimulada em muitos setores sociais,
profissionais e empresariais. A própria medicina dá destaque a essa estratégia
como um reforço e adjunto terapêutico. Nos conjuntos habitacionais, nas
empresas voltadas para atividade esportiva, nas academias de exercícios
físicos, fala-se muito nas atitudes e aquisições voltadas para a qualidade de
vida. O que seria então, ou melhor como se poderia definir qualidade de vida?
Seriam todas as ações, comportamentos e atitudes que de fato tragam melhorias
na saúde das pessoas, nas relações sociais e na interação com o meio ambiente e
com a natureza à nossa volta. E aqui já
deixo uma advertência: existe muita enganação nesse chamado segmento de
qualidade de vida; notadamente a oferta de produtos nutricionais duvidosos e
outros insumos sem comprovada eficácia ou beneficio de produzir este efeito ou
uma performance física. Fiquem alertas porque tem-se vendido e induzido um
rosário de “besteiras” de pura falsidade e ilusão para as pessoas. Nessa lista
têm-se até igrejas vendendo passaportes para o céu em troca de doações e bens pessoais.
E como trazer tais estratégias de mais saúde, de mais
bem-estar, de mais alegria e felicidade na vida das pessoas e das
famílias? Tudo que se pode adotar, adquirir como qualidade de vida tem
aspectos subjetivos. Nem sempre bens materiais e dinheiro estão associados a
qualidade de vida. Tais aspectos vão depender do que fazer com cada pertence ou
compromisso na vida diária de cada um. A melhor dica seria buscar não uma felicidade material, mas sobretudo
pessoal, existencial, social e de possuir uma consciência de paz consigo mesmo
e com os outros e os poderes públicos constituídos.
Para mais clareza e materializar as noções de qualidade de
vida trago à baila o que muitas pessoas adotam e assumem como qualidade
negativa ou depreciação em suas vidas. Nesse tom podem-se sublinhar como
exemplos os compromissos financeiros que cada um assume para se apossar desse e
outro bem material ou status social, a titulo de estar de acordo com os padrões
impostos pelas mídias e redes sociais, com os modismos da época.
Nesse pacote entram por exemplo cartão de crédito, “cheque
especial”, dívidas, hipoteca de bens , empréstimos particulares, fiadores, etc.
O melhor conselho é o de ser feliz do jeito que a pessoa nasceu e com os bens
que ela possa adquirir sem se endividar.
Enfim, são os chamados trambolhos ou estrupícios que muitos
e muitas agregam em suas rotinas , que lhes trazem apenas qualificativos
negativos e ruínas em suas vidas.
Um dos estrupícios encontradiços em nossa sociedade
tornou-se a posse dos pets ou animais de estimação (cães na maioria). São
muitos os exemplos de pessoas ou casais que mal cuidam da saúde de filhos e
de pais, sequer cultivam boas relações sociais ou com o
meio ambiente, mas têm em seus apartamentos dois animais; que dão tanta despesa
quanto um filho. São vacinas, cuidados veterinários , rações da moda; até
vestuário os bichos têm. Os chamados “
pais ou mães” desses animais levantam pela manhã, limpam e recolhem fezes e
urinas dos bichos, dão-lhes as rações ou remédios necessários; chegam as
visitas tem-se que prender os animais porque eles são territoriais e sentem os
donos da casa. Enfim , fica a pergunta: qual a finalidade de um animal desses
em apartamento ? E o pior, tem donos que não cuidam a contento dos animais e de
suas “porcariadas”.
Outros estrupícios ou trambolhos vistos são muitas relações
conjugais. Sejam como namoro, casamento ou união estável. Ou seja, é uma pessoa
arruinando a vida da outra pessoa. São trambolhos humanos que infernizam,
quando não chegam ao assassinato do outro. É pura insanidade mental, alguém
adotar uma outra pessoa, que se torna um estrupício , estrovenga ou
tormenta nessas relações.
E não são poucos os
casos dessas relações que desgraçam e martirizam não só a vida da pessoa, mas
de uma família. Já bastam por exemplo, muitos parentes de sangue que a
pessoa se vê por questão genética e de generosidade a cuidar e se dedicar à
sobrevivência e cuidados alimentares, de higiene e da saúde desse membro
familiar. Não contando aqueles
Balduínos e Valdevinos da vida que se tornam eternos comensais e
aditivos , que nem trabalham nem estudam e se tornam eternos dependentes da
família e do Estado.
Em conclusão, são modismos impostos pelas regras do consumo,
são atitudes, permissões e aquisições
que, de forma deliberada ou não, entram na rotina das pessoas de forma a anular
ou impedir a tão almejada e buscada qualidade saudável e construtiva de vida.
Novembro/2016.